quinta-feira, 24 de abril de 2008

O Jornal de Amarante pronuncia-se sobre a sessão pública do passado dia 19.

“Se se avançar com a construção da barragem de Fridão, Amarante pode sofrer um desastre ambiental irreparável”, considera Rui Cortes, professor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). Entretanto, a Comissão de Acompanhamento do projecto da barragem de Fridão, criada no âmbito da Assembleia Municipal, e a que preside Abel Afonso, da bancada do PSD, levou a efeito, no salão nobre dos Paços do Concelho, como primeira diligência, uma sessão pública, visando alertar os amarantinos para o impacto sobre a cidade de Amarante, desta barragem que será levada a concurso já no final do corrente mês.
A sessão decorreu no passado dia 19, sendo presidida pelo Presidente da Assembleia Municipal, que foi portador de uma mensagem do Presidente da Câmara Municipal, justificando a sua ausência, e contou com a presença de numeroso público, representantes das diferentes forças políticas e presidentes das Juntas mais directamente envolvidas.
As comunicações, a cargo dos Professores Hélder Leite e Rui Cortes, e da Eng.ª Berta Estevinho, incidiram sobre “as necessidades energéticas-qualidade ambiental”, “Portugal e as energias renováveis, no contexto da União Europeia” e “as vantagens e desvantagens da barragem de Fridão e os impactos ambientais expectáveis”.
Feita uma abordagem às problemáticas, da factura energética e das energias renováveis, foi focalizado o contributo das novas barragens para a diminuição da dependência dos combustíveis fósseis e para a redução das emissões de gases geradores do efeito de estufa, nomeadamente de CO 2, face ao protocolo de Quioto.
Já durante o debate, foi sublinhado que, nesta vertente, o conjunto dos dez novos empreendimentos hidroeléctricos, resultará numa comparticipação de apenas 3% nas necessidades de energia eléctrica e numa redução em 1% das emissões de CO2, sob um pano de fundo em que Portugal é, entre 12, o único dos países da Europa que ainda detém um saldo de emissões de CO2 que pode canalizar para o investimento, a par de que o programa de barragens colide, noutra vertente, com compromissos que vinculam também o nosso País, ao nível da biodiversidade, equilíbrio ambiental e preservação das águas superficiais.
Acresce que a bacia do Tâmega, no troço em que vão ser implantadas as cinco barragens a montante de Amarante, está classificada, por lei, como zona sensível, face aos elevados processos de eutrofização a que está sujeita, o que sempre contra-indicaria o incremento exponencial de tais fenómenos com a constituição de albufeiras. Em termos sucintos, foi esclarecido que a eutrofização é o resultado da acumulação de adubos e nutrientes nas águas, desencadeando a proliferação de plantas e algas, que acabam por comprometer a oxigenação necessária à sobrevivência da fauna e flora indígenas .

Destruição do
conjunto histórico

Em contrapartida, foi apontada a mais valia das novas barragens como forma de rentabilizar os excedentes da energia eólica nos períodos em que não venham a ter escoamento, canalizando-os para a bombagem de água, de retorno às albufeiras, de modo a voltar a ser turbinada nos picos de maior consumo.
Só que Fridão não está concebida para essa dupla valência, contrariamente às restantes quatro barragens a montante, designadas, nessa perspectiva, como reversíveis.
Foi também referido o transvase do rio Olo, para reforço da barragem de Gouvães, e a possibilidade da criação de uma pequeno açude imediatamente a jusante da barragem de Fridão na perspectiva da sua eventual reversibilidade, o que o Programa não contempla objectivamente.
Já a construção de um outro açude imediatamente a jusante da cidade, sob pretexto de impedir o refluxo das águas e algas da barragem do Torrão e da preservação de um lençol de água permanente, no troço do Centro Histórico, numa cota três metros superior ao actual nível médio, mas, no fundo, franqueando a exploração daquela barragem, à cota 65 (o que extrapola o programa) constituindo um obstáculo imediato, passível de interferir com a amplitude das cheias e segurança na zona ribeirinha, implicaria a submersão definitiva, das margens e ínsua, e a destruição, irreversível, da moldura natural do conjunto histórico da ponte e Igreja de S. Gonçalo como factores âncora de uma economia virada nuclearmente para o turismo.
Foi ainda citado que o projecto de Fridão envolve o levantamento de linhas de muito alta tensão, num trajecto de dezenas de quilómetros, tendo, os palestrantes, referido, que não há ainda estudos científicos que comprovem os riscos para a saúde humana, (ou que os afastem, como foi replicado).
Rui Cortes, da Universidade de Trás–os–Montes e Alto Douro (UTAD), foi peremptório ao concluir que se se avançar com a construção da barragem de Fridão, Amarante pode sofrer “um desastre ambiental irreparável”, especificando que será inevitável a alteração do clima, a persistência de nevoeiros, maus cheiros, a radical alteração dos ecossistemas, a drástica degradação da qualidade da água para consumo, ou sequer para banhos, regas e actividades lúdicas, “como consequência dos inevitáveis processos de eutrofização, e da proliferação de algas, algumas das quais tóxicas, que conduzirão, fatalmente, à morte das espécies piscícolas autóctones e à sua substituição por espécies exóticas”.
Este docente destacou ainda que o caudal ecológico mínimo obrigatório, será, de todo, insuficiente para sustentar a fauna e a flora existentes, podendo ocorrer que o leito do rio fique a descoberto, nalguns períodos e troços, e resumindo em que, Amarante, conforme a conhecemos, desapareceria”, e que a subida da cota da albufeira do Torrão agravaria o desastre ambiental.
No debate foi, ainda, relevado que o paredão da barragem assentará numa base tectónica instável, e como tal susceptível de potenciar os riscos dos sismos induzidos pela tremenda massa de água apresada na albufeira. E que, apesar desse conjunto de implicações, tudo parece continuar a girar, e não só a nível da opinião pública, em ritmo normal, como seja a construção de um dispendioso Centro de Estágios de Águas Bravas em Fridão, que deixará de ter águas bravas, ou até, um projecto privado para a reactivação da Central de Olo como se o desvio, a montante, do caudal que a rentabilize, não estivesse expressamente contemplado no Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico.
A finalizar, o Presidente da Assembleia Municipal deu a conhecer um estudo científico sobre a emergência de acidentes com barragens, na perspectiva de que um volume de águas de centenas de hectómetros cúbicos, numa cota de 90 ou 110 metros superior à da zona ribeirinha da cidade, e a cerca de seis quilómetros a montante, constituirá uma ameaça permanente, a pairar sobre os residentes, e na possibilidade de uma rotura, só remotamente possível, ela será catastrófica. E encerrou, reforçando que o Presidente da Câmara e a edilidade continuam em completa sintonia com a moção aprovada por unanimidade em sessão no último trimestre de 2007, assumindo perante o Ministro do Ambiente que “a Câmara Municipal de Amarante, convicta de estar a interpretar os mais legítimos interesses dos cidadãos que representa, decide manifestar a sua firme oposição à construção da Barragem de Fridão e à alteração da cota máxima de exploração da Barragem do Torrão acima da cota 62”.

Sismos induzidos

Durante o debate, o deputado municipal por Amarante, Emanuel Queirós, alertou para o perigo dos sismos induzidos, um problema que, afirmou, «está completamente desvalorizado e foi até descurado» na análise dos dez empreendimentos considerados prioritários. Dos dez aproveitamentos seleccionados pelo Governo, a barragem de Fridão é a segunda infraestrutura em potencial hidroeléctrico, logo a seguir a Foz Tua, já adjudicada à EDP.
O Ministério do Ambiente anunciou que o concurso para a concessão da barragem de Fridão será lançado a 30 de Abril.

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